Na América acontecem as coisas mais estranhas. Quando aterrei no aeroporto de Norfolk, Virgínia, ainda fiquei sentado uns minutos. Tinha ao meu lado um americano aflito, com dimensões XXL, a quem deviam ter reservado dois lugares no avião em vez de um. O homem era tão grande que fazia aflição. Por isso decidi levantar-me, libertá-o o mais depressa possível daquele aperto de seis horas e meia. Mal fiquei de pé (como metade dos passageiros), um homem, no banco da frente berrou: "Está assim com tanta pressa? Não sabe as regras? Porque é que não espera a sua vez e não deixa as outras pessoas sair primeiro!" Estarreci. Parecia que me queria bater. Ainda argumentei que não lhe tinha feito mal nenhum, blá-blá-blá, mas esperei que ele saísse primeiro.
Uns dias depois, em Washington, fui a uma livraria perto de Dupont Circle que está aberta toda a noite, e tem um belíssimo restaurante, um bar e música ao vivo. Escolhi dois livros que talvez não tivessem desconto na Barnes & Noble e dirigi-me ao balcão para pagar ao mesmo tempo de uma rapariga. Ela hesitou. E eu disse qualquer coisa como "faça favor". E ela fez. A empregada passou a pilha de livros dela no leitor óptico e os que estavam ao lado. Eu ainda disse, "esses livros são meus", a funcionária disse "eu sei", e fiquei a pensar que estava a fazer as contas separadas. Mas não. A moça tinha pago os meus livros. Saí porta fora e pedi explicações: "Por que carga de água é que pagou os meus livros?" Ela disse que tinha sido muito mal educada por ter passado à minha frente e que por isso tinha decidido pagar a conta. "Deixe lá, ela é assim", acrescentou a amiga que estava com ela. Ainda argumentei, blá-blá-blá, eu é que lhe tinha cedido a minha vez e tal, mas não funcionou. Voltei à livraria, perguntei quanto custavam os livros: 50 dólares, quase dez contos de réis. Corri para a rua. Tinha desaparecido.
Este é um episódio que jamais teria lugar em Portugal, fosse com livros ou rebuçados. E olha, fiquei a pensar nisso.
A propósito, os livros são: "The Irak War", do jornalista e historiador inglês John Keegan; e "The War for Muslim Minds", do académico francês Gilles Kepel.
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