"Uma das coisas que mais me irrita no facto de ser turista é a minha própria cumplicidade no hábito de riscar coisas numa lista. Os Giottos - feito, Igreja dos Eremitas - feito, Piazza dei Signori - feito, e assim por diante. Quem quer saber? como um qualquer peregrino medieval, ali estava eu a acumular pontos junto de... junto de quem, exactamente? A quem iria apresentar a minha caderneta? Há algo de estranhamente religioso, no sentido mais conservador, no turismo moderno."
in Cartas de Veneza, Robert Dessaix
Gótica, pag. 191
Ir de férias é um momento único nestas vidas que levamos. A fuga é tanto mais saborosa quanto para mais longe formos, como catarse de todo um ano a aturar aquela gente no emprego. Ir aos lugares e vê-los é pouco (ver post abaixo). Não saio de uma cidade sem ver aquilo que é obrigatório, mas saio frustrado se me for embora sem perceber o que vi. Percorrer a lista não chega, olhar para pedras antigas é pouco, conhecer as histórias por detrás do que vemos é que é importante. E nem sempre consegui esse equilíbrio nestes 15 dias em Veneza, na Croácia e na Bósnia: Veneza merece uma visita de Inverno para nos embrenharmos nas histórias; Dubrovnic, no sul da Croácia, merece tempo (também em época baixa para fugir do terror do turismo de massas) porque é uma das cidades mais encantadoras que já vi; o mesmo serve para Mostar, na Bósnia, onde ver as diferenças entre os habitantes de uma e outra margem é essencial.
Riscar os lugares que já vimos na nossa lista de sítios obrigatórios, como numa romaria, é fundamental, mas pobre. O que faz os lugares são as pessoas, as falas, os hábitos, as comidas, os cheiros.
Por isso, a pior maneira de se viajar é em pacotes organizados, apesar de um amigo que tem uma agência passar a vida a tentar impingir-mos. Já fiz duas viagens dessas: uma à Turquia, porque era barato, e outra ao Egipto, porque era a melhor maneira de o fazer. Neste estilo de viagem empacotada é tudo automático e pouco mais fazemos do que riscar da lista os lugares que já vimos. Ao fim de uns dias estamos como aqueles turistas americanos que vieram fazer um tour pela Europa. Depois de uma semana e de quatro países, Bill perguntava a Tom: "Onde é que estamos hoje?" E o amigo respondia: "I do not know. But it's friday, it must be Belgium..."
Sem comentários:
Enviar um comentário