Em quinze dias nos Estados Unidos podem ouvir-se muitas opiniões, mas o que mais me espantou, entre visitas ao Departamento de Estado, ao Pentágono, ao Congresso, ao Senado e a respeitados think-tanks, é que a Política Externa de Bush e de Kerry poderá não será radicalmente diferente. Este é um resumo muito ligeiro do que disseram algumas pessoas que ouvi, com um grupo que integrava.
Simon Serfaty : Eleições para os próximos 20 anos
Professor universitáro, analista político, foi durante mais de 10 anos director do Programa para Europa do Center for Strategic and International Studies (CSIS) (http://www.csis.org/)
Para Simon Serfaty, estas são “as eleições mais significativas desde 1948, em termos de implicações internacionais”. Nem Kerry nem Bush podem fugir das novas estratégias de segurança traçadas depois do 11 de Setembro, daí o professor considerar que “o que eles puserem em marcha vai definir o que será o mundo nos próximos 20 anos”.
Mas em que sentido é que podem prever-se essas mudanças? Serfaty diz que não está preocupado com “a transição de Bush para Kerry”, mas sim com a transição de “Bush para Bush”. E porquê? Porque “Bush é um homem de convicções, ele sente as coisas, não as explica ou compreende”. É o homem que respondeu a um jornalista que o seu filósofo preferido era Jesus Cristo, mas não se deu ao trabalho de dizer porquê, alegando que o outro não compreenderia. “Ele diz ‘I feel’ e não ‘I think’”. Para o analista do CSIS, a personalidade do indivíduo que se senta na Sala Oval pode fazer toda a diferença. “Kerry vai querer ir ao encontro dos europeus e reabrir o diálogo”. Mas a sua política dependerá das respostas que obtiver.
The Atlantic Council: Política externa europeia está à espera do resultado das eleições
Neste think-tank que se diz independente, mas onde estava um cartaz de apoio a Kerry, uma das altas responsáveis resumiu muito bem qual a sensação que se tem em Washington em relação aos governos europeus: “Aqui sente-se que os europeus estão à espera do resultado das eleições para avançarem na sua política externa. Isso é muito mau se Bush ganhar”. E ainda foi mais concreta: “Tenho avisado os nossos amigos a não esperarem grandes mudanças na nossa política externa. Não esperem mudanças fundamentais com uma alteração de administração. Esperar isso seria esperar em vão”. A diferença seria a seguinte: “Kerry pode ser mais activo a abordar o conflito israelo-palestiniano. Mas na questão multilateral isso depende de como os parceiros europeus reagirem. As administrações querem é eficácia”.
John Huslman, Heritage Foundation : Simpatia não é tudo
Para este republicano da fundação conservadora da escola realista (e não neoconservadora), o caso do Irão pode vir a ser o paradigma de uma alteração na Política Externa norte-americana. “Todos achamos que é útil encontrar uma solução diplomática. Todos temos medo que os israelitas tomem a situação nas suas mãos”. Os americanos estão muito preocupados com isto e Kerry não se cansou de o dizer na campanha.
Huslman diz que “Kerry começará por ir à Europa dizer que tudo se trata de uma questão de estilo”, mas o analista também entende que “não é esse o problema”. E concretiza: “Há pessoas da entourage de Kerry que acham que os países europeus não vão dar mais tropas [para o Iraque e o Afeganistão] só porque ele irá à Europa falar com os líderes de uma forma mais simpática”. No caso de haver um segundo mandato de Bush, “o tempo definidor será entre Janeiro e Fevereiro [com as eleições no Iraque]. No Partido Republicano haverá uma guerra civil entre realistas – que é a visão tradicional – e neoconservadores. Se Bush perder as eleições, os neocon serão os culpados”, considera.
As diferenças entre os dois candidatos serão mais de estilo, segundo Huslman. No caso do Irão, por exemplo, “Kerry terá maior capacidade para se coordenar com os três da União Europeia [Alemanha, França e Reino Unido] nos primeiros quatro meses. Se Bush disser que vai atacar, todos sabem que será assim”.
Congresista Robert Wexler, democrata, da Flórida: "A fresh new start"
Pertence ao sub-comité para a Europa
Claro que agora é contra a intervenção no Iraque, destacando a ida para a guerra com base em falsas premissas, mas tal como Kerry votou a favor. “A pessoas como eu, que não alinham com Bush, colocou-se a questão: vamos votar por Bush ou por Chirac?” Embora seja um democrata do tal Estado, a Flórida, concorda que as maiores diferenças entre Kerry e Bush “são uma questão de grau”. É o que se deduz também destas palavras: “Talvez o melhor fosse mudar de administração e ter mais credibilidade. A União Europeia tem um papel a desempenhar. Mas se a Europa não for séria, apenas os EUA podem actuar”. No caso concreto do Irão, Wexler concretizou melhor a sua opinião: “A Europa ainda parece incapaz em termos de vontade política, para dar os próximos passos, o que me leva a pensar que se a União Europeia não actuar, serão os EUA a ter de agir”. Ora que diferenças temos aqui para os maiores falcões da administração Bush? “Com Kerry seria diferente porque toda a abordagem da sua administração seria muito mais multilateral. Bush não tem credibilidade e com Kerry teríamos um ‘fresh new start’”.
No entanto, quando se fala da reconstrução do Iraque, ele responde aquilo que os seus eleitores gostariam de ouvir: “Estou é preocupado com a reconstrução da Flórida, não com o Iraque”. (A conversa tinha-se passado poucos dias depois dos furacões terem devastado o seu estado).
Senador Richard Lugar, presidente do Foreign Relations Committee
Richard Lugar falou ao grupo na sala da comissão de Senado que durante anos partilhou com o senador John Kerry. Portanto, apesar de ser republicano, diz conhecer bem o candidato democrata: “Kerry é muito como Bush. Ainda são as mesmas pessoas que o aconselham e eu conheço-as muito bem”.
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