... há metal fundente", escreveu Cesariny num poema excepcional, de múltiplas aplicações. Entre nós e as palavras dos políticos, o que há é material gasoso.
Na campanha eleitoral, em 2005, Sócrates disse isto: "As taxas moderadoras servem para moderar os excessos de alguém que vai usar uma emergência hospitalar sem razão, para que tenha uma penalização. Não serve para financiar o sistema. O sr. primeiro-ministro [Santana] falou foi numa taxa que permitisse aumentar as receitas do Estado no Serviço Nacional de Saúde. Isso é na prática um novo imposto. Isso é um erro". Entre estas palavras e os factos de hoje, há metal contundente, mas inconsequente. As taxas de utilização na saúde, para cirurgias e internamentos, são o quê?
No debate com Santana na SIC, também em 2005, Sócrates afirmou o que toda a gente sabe: "Não estou de acordo com a subida dos impostos, não estou (...). Foi no momento de falha dessa promessa eleitoral, quando o Governo [de Durão] chegou ao poder e decidiu aumentar o IVA que a confiança veio por aí a baixo. Isso foi uma leviandade. Isso foi muito negativo para a democracia". Esta frase devia ser lida e relida, por cada um de nós, antes de decidir em quem votar nas próximas eleições. Estas palavras valem tanto quanto a possibilidade de conquistar o poder. Entre nós e as palavras, há poder.
Cada palavra vale o que vale. E vale muito pouco, por vezes. Um palavra pode ser um som, apenas, que sai de uma boca. Um grunhido desmiolado pode valer tanto como um palavra. A palavra também pode pesar como chumbo. Quando Manuel Pinho disse "a crise acabou", foi um caso desses, em que ao signo não corresponde um significado. Caso contrário, não teria dito no dia seguinte, que decretar o fim da crise era uma "infantilidade". Ele pronunciou aquele conjunto de sons e pronto, o significado evaporou-se.
Entre nós e os políticos não há nada se as palavras não tiverem consequências.
1 comentário:
Quase no final do poema existe uma frase ainda mais expressiva: «Entre nós e as palavras, os emparedados».
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