Devemos à conjunção de um espelho e de uma enciclopédia a descoberta deste mundo. Por Vítor Matos e Tiago Araújo
04 dezembro 2006
Ainda não andava na escola e os miúdos da rua da minha avó eram quase todos maiores que eu. Armávamo-nos de paus compridos com um mais pequeno atravessado, pregado com um prego e tínhamos a espada. Depois, com contraplacado, fazíamos escudos, que segurávamos com cordas ou fios eléctricos. E enchíamos os bolsos com pedras. A seguir, as hostes inimigas enfrentavam-se na "Sopa" - o largo em frente à abandonada Igreja de são Pedro, a antiga sopa dos pobres, em Grândola - e lutávamos. Não me lembro de ficar magoado, embora duvide que tal se devesse à minha valentia. Nem faço ideia se alguma vez aleijei alguém. Era pequeno e até à adolescência fui fraco na luta corpo a corpo. Mas aquela coisa bélica, natural, em crianças a fazer de soldados medievais dava uma adrenalina que não esqueço. Talvez a mesma razão levasse o Tiago a ser cúmplice nos assaltos à fruta dos quintais alheios. Em geral, também eu fui bem comportado, mas hoje sei porquê: havia uma dimensão ética qualquer, o que na infância é um misto de medo e dever ser perante o bem e o mal, que vem da autoridade dos pais, e mantém um certo padrão ao longo da vida.
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