31 agosto 2006

Outra

Dizimar: But for all her [the Roman Republic] administrative acts the most terrible was the practice of ‘decimating’ an army, i.e. of choosing by lot every tenth man, and putting him to death. Machiavelli, The Discourses

29 agosto 2006

Muitas das palavras modernas incorporaram uma magia ou superstições antigas, cujo significado está longe de ser óbvio quando as utilizamos. Não sabemos o que dizemos, literalmente. Os íncubos eram, segundo acreditavam alguns povos, demónios que desciam dos céus e possuíam as mulheres durante o sono. Ao que parece, no inglês arcaico, a esses demónios dava-se o nome de mare, o que estará na origem da palavra nightmare. Isto confere uma perspectiva completamente diferente à expressão «It was just a nightmare». Em português, utilizamos a palavra pesadelo, cuja etimologia felizmente desconheço.

(A sugestão para o post foi da Joana, que tirou a ideia de um livro do Carl Sagan. Começa-se assim, acaba-se a fazer malha ou a construir puzzles de quinze mil peças.)

28 agosto 2006

Choque de titãs

Aristóteles:
«a beleza excessiva, a força extrema, a linhagem inigualável, a riqueza desmedida, ou os respectivos opostos, tais como a pobreza excessiva, a debilidade extrema, e a ausência de honrarias, têm dificuldade em seguir a voz da razão.» Política, Livro IV (sobre as virtudes da classe média)

Lou Reed:
«Average looks, average taste
average height, an average waist
Average in everything I do
my temperature is 98.2

I'm just your average guy
an average guy

[...] trying to do what’s right»

Average Guy, The Blue Mask, 1982

(É bom saber que a democracia precisa de pessoas como nós.)

27 agosto 2006

1º post do Guegué:

gbxxxxxxxxx xxxxcvxk jjjd l mrsnmsxncdz

Promoção nuclear

...pelo contrário, temos a promoção dos uranianos, vizinhos dos uraquianos, e que detestam os umericanos, que aprenderam a enriquecer urânio, e, eventualmente, a fazer explosões nucleares, coisa só vista no campeonato estelar.

24 agosto 2006

Provedor do leitor

Alice sighed wearily. ‘I think you might do something better with the time,’ she said, ‘than waste it asking riddles that have no answers.’

Despromoção à liga de honra

Depois do Gil Vicente, Plutão. Sem possibilidade de recurso.

Turismo suicida

Depois de ter passado, numa noite sem televisão, um quarto de hora a tentar perceber o conceito de entropia, compreendo que Boltzmann, o físico que o definiu, se tenha suicidado. O que acho estranho é ter-se suicidado quando estava de férias em Itália, na Baía de Duíno, perto de Trieste. Enquanto a mulher e a filha foram nadar, ele enforcou-se. O que demonstra o elevado grau de desordem em que se encontrava o seu sistema físico.

(Pouco tempo depois, dados experimentais viriam a confirmar as suas teorias.)

21 agosto 2006

Dizem que a solidão não se cura com comprimidos. Isso contraria a minha tese (de que já tratei aqui) sobre a relação entre os reformados e os centros de saúde. De um modo geral, os reformados têm tendência a juntar-se a outros reformados – num fenómeno semelhante ao das gotas de mercúrio – em lugares como centros de saúde, filas de minipreço e balcões da Caixa Geral de Depósitos. Este facto, pouco estudado, contribui para o défice do sistema nacional de saúde e para um gasto excessivo em cadernetas CGD, sempre perfeitamente actualizadas. O senhor doutor receita gotas para os olhos, cremes para a espondilose, ampolas para as diabetes, quando para alguns casos bastaria um baralho de cartas. 7h30 da madrugada, senha 31.

13 agosto 2006

Meta-post

Os escritores têm o trauma da página em branco. Os bloggers têm o da eternização do último post. Quando não se alimenta o animal de forma regular, colocar um texto torna-se uma responsabilidade demasiado grande. Se não for bom, as pessoas que visitam o blogue vão ter, ainda assim, de lê-lo de modo recorrente durante semanas. Uma solução é adoptar a teoria do eterno retorno: escrever cada post como se pudesse ser lido infinitamente. A outra é ir escrevendo qualquer coisa para ir empurrando o passado para baixo.

08 agosto 2006

The Passenger, Michelangelo Antonioni

Apesar de, tirando o Jack Nicholson, os outros actores não terem jeitinho nenhum para a coisa; apesar de a Maria Schneider passar o tempo todo com cara de quem a margarina de Paris lhe caiu na fraqueza; apesar de muitos dos diálogos parecerem artificiais; apesar de a música do Iggy Pop compreensivelmente não fazer parte da banda sonora (acho que só foi gravada mais tarde); gostei do filme.

04 agosto 2006

I.A.

Na escrita inteligente do meu telemóvel quando tento escrever o meu próprio nome aparece primeiro a palavra «vício». A primeira reacção é pensar «Fui descoberto». É natural que a inteligência artificial venha a evoluir exponencialmente no meu tempo de vida, mas nem a leitura dos livros do Arthur C. Clarke e do Ray Bradbury, na adolescência, me preparou para ser psicanalisado por uma máquina. Na dúvida, atribuo o fenómeno a uma infeliz coincidência alfabética.

03 agosto 2006

Banhos de sol


Domingos sem charme, dias sem interesse, banhos de sol dos pobres.

- Ai se eu fosse nova, o que era dos rapazes que passavam. Havia aqui dantes tanta tropa... Mas no meu tempo não se podia, era uma vergonha, sabe lá. Agora faço o que me apetece e a minha filha até pensa que fui à missa. Adeus, e aproveite enquanto pode...

Ao domingo sai do bairro da Bica, atravessa a estrada até ao Tejo e senta-se ali, num banco perto do parque de estacionamento, que havia de ser o de um jardim.

Nem o peixe pica nem ganha o Benfica


- Ó chefe, hoje isso 'tá a dar?
- O peixe não pica... 'tá pior que o Benfica!

Na calçada entre o Cais do Sodré e a Praça do Comécio, os pescadores alinham-se aos domingos de manhã, e esperam.

- Mas ó chefe, o peixe daqui é bom?
- Olha, olha, então não é? Ele são linguados, sargos, você sabe lá? Já viu ao preço que isto 'tá na praça?...

02 agosto 2006

À pesca das tágides



- Olha que belo homem! Um fisherman...

- Liiindo português! Digo alguma coisa?

- Nã...

- Olha o brilhozinho daquela barriga. E a cana...

- Eu cá gosto mais da careca e do bigode.

- É a encarnação da verdeira alma lusitana à pesca submarina de tágides. Olhe, mister? Não vai um fadinho?

01 agosto 2006

Estas fotos foram tiradas num passeio, este domingo, com o Afonso. Postarei mais.
Tiago, bom regresso! Dá-me as tuas legendas também.

A linha do destino


Na linha do destino, velhos desconhecidos na hora das observações.

Luz rolante


Uma caminhada lenta, agonizante, num comboio rolante que leva esta gente toda até ao sol urbano de Carcavelos.

Região solar


A espera, um café tomado em pé, um passo antes de tempo e somos luz quando o sol nos atravessa com partículas de hélio.

Praia dos pobres


Domingo. Estação do Cais do Sodré. Às nove e meia da manhã o povo move-se na estação com um frenesim de sentido contrário: hoje eles não chegam a Lisboa, hoje eles vão. De guarda-sol enrolado, calções vestidos, sandocha na mochila, toalha ao pescoço, cores que se vejam. A praia é dos pobres na linha do Estoril. O sol quando nasce é para todos, sabia-se. A areia não. Cada um vai a banhos onde pode.