28 outubro 2005

Lisboa-Porto num shot


Diz a assitente de bordo:
- Quer um TGV ou uma OTA?
Responde o passageiro:
- Pode ser um TGV, sim, nunca bebi uma OTA...
- eeeerr, é uma Orange+Tequilla+Aniz! - explica ela.
- Hum, prefiro um TGV. A viagem passa mais depressa. Traga-me dois. E um absinto, por favor.

27 outubro 2005

Recordando...


Com Cavaco a concorrer, agora discute-se a presidencialização do regime. Tem piada, porque em 2001, como Sampaio era pouco interventivo, o debate análogo sobre os poderes presidenciais era sobre se o Presidente da República devia ser eleito por sufrágio universal ou por via indirecta. Ele há coisas neste país que mudam com uma facilidade... e ninguém se lembra?

25 outubro 2005

Coincidências

Os ex-PRD Carlos Beato (presidente da câmara de Grândola eleito pelo PS) e Pedro Cannavarro, que foi presidente do defunto partido renovador (para não falar em Ramalho Eanes), apoiam Cavaco Silva. Lembram-se qual foi o partido que, em 1987, apresentou uma moção de censura para derrubar o Governo minoritário do PSD? Sim, foi o PRD. E logo a seguir Cavaco teve a primeira maioria absoluta...

24 outubro 2005

Lembrando, comparando...


"Convocaria eleições no momento em que estivessem esgotadas as hipóteses de obtenção do necessário apoio parlamentar à constituição de um governo. Contraria a minha experiência para avaliar as condições de governabilidade", disse Cavaco Silva, na 1ª campanha presidencial: DN - 11 de Janeiro de 1996.Lembremo-nos de que Guterres não tinha maioria absoluta.

"Eu sou um defensor da estabilidade política. Não se conseguem ultrapassar as dificuldades sem estabilidade. [A dissolução] Só deve ser utilizada em situações muito extraordinárias", disse Cavaco Silva, na apresentação da campanha presidencial II: 20 de Outubro de 2005. Ligeiramente diferente da opinião da década anterior. Para não assustar os socialistas nem os sociais-democratas traumatizados.

"O senhor [dirigindo-se a Jorge Sampaio], não esteve na Alameda politicamete. E sempre esteve nos antípodas de Mário Soares", disse Cavaco Silva, na 1ª campanha presidencial, no debate com Jorge Sampaio e Jerónimo de Sousa na Prova Oral da RTP, a 15 de Dezembro de 1995. Tecerá hoje louvores a Jorge Sampaio para atacar Mário Soares? Ficamos à espera, porque a política tem coisas destas.

"[O Rendimento Mínimo Garantido] gera muitos problemas: desincentiva a procura de trabalho, requer mecanismos administrativos complexos para o seu controlo, dá origem a grandes fraudes e provoca injustiças. Não resolve os problemas da pobreza", disse Cavaco Silva, na 1ª campanha presidencial à Revista do Expresso, 12 de Janeiro de 1996. Manterá a mesma opinião agora?

"Com o poder todo concentrado num só quadrante ideológico, não vejo nada um futuro cor-de-rosa (...). Com tudo cor-de-rosa não antecipo nada de bom para Portugal", disse Cavaco Silva, na 1ª campanha presidencial na mesma entrevista à Revista do Expresso, em 12 de Janeiro de 1996, a dois dias das eleições. Poderá hoje dizer a mesma coisa, quando ainda há mais poder concentrado nas mãos dos socialistas? É claro que não voltará a usar este argumento.

Dez anos é muito tempo...

20 outubro 2005

Adivinhando


Hoje, dentro de uma das suas obras emblemáticas e à hora dos telejornias, Aníbal Cavaco Silva vai dizer que é candidato a Presidente da República.

1 - A sua declaração será curta e incisiva, ao contrário da de Mário Soares que foi longa, fastidiosa, e vazia de conteúdo;
2 - Não vai ter a sala cheia de convidados, mas sim de jornalistas, para evitar colagens excessivas a partidos (ao PSD) e Marques Mendes não deverá lá estar; Mário Soares tinha a sua sala no Altis cheia de notáveis e de gente do PS para mostrar que tinha uma data de apoios;
3 - Vai responder a perguntas dos jornalistas para mostrar que não é aquela figura fechada e antipática de outros tempos, ao contrário de Soares que não quis ser questionado a seguir à sua apresentação (e que toda a vida falou aos jornalistas);
4 - Para já, não fará grandes avisos à navegação socialista e até há-de elogiar o esforço de contenção deste Orçamento do Estado, para não hostilizar os socialistas;
5 - Voltará a apresentar-se como homem providencial que regressa com sacrifício da sua vida pessoal para endireitar as coisas (aliás, tal como Soares);

Quem há 10 ano pensou que o Acabado Silva estava mesmo acabado...

15 outubro 2005

Arquitecto no saco


Meteram o arquitecto no saco. Que será dos meus sábados, a partir de agora, sem aquelas ironias tão finas que quando estão de frente parece que estão de lado e é preciso explicá-las na semana a seguir? Em que sacos hei-de procurar agora prosas saraivadas? Heeelp! Preciso da minha dose semanal de Saraiva.

13 outubro 2005

Ao largo na Graça


Pode. Tire lá a fotografia. Assim 'tá bem? Deixe-m' ajeitar o boné… E o cigarrinho? Vou dar uma passa no cigarrinho. Ficou bem? Sou aqui da Graça, pois, sou daqui. Agora isto há prá’qui muita gente. É a esplanada há uns dois anos. Dois anos? Se calhar há mais... Já custo a andar. Só com a bengala. E devagar. São os anos. Uma data deles. Bailei muito nesses Sant' Antónios. Agora tod'á gente vem p'ráqui. Acho bem. A malta tem de se divertir, não é? Vou andando devagarinho, assim, 'tá a ver. Visto o fatinho, já tá velho, e dou uma volta, vejo a vista, as camones, até assobio a elas, dou pão aos pombos, bato uma manilha ali no largo, quando calha. Já não posso dar no tinto, mas às vezes vai um gole no branco, eh, eh. É assim. Saudinha da boa!

12 outubro 2005

Arqueologia das palavras


Se a Odisseia é a precursora dos Indiana Jones e demais histórias de aventuras, a Ilíada inaugurou os Apocalipse Now de todos os tempos e demais contos de guerra. O Senhor dos Anéis, porém, mistura tanto aspectos homéricos da Odisseia como da Ilíada. É uma guerra e uma busca, uma ida e um regresso. Mas para lá da narrativa, há detalhes que me impressionam na leitura das traduções de Frederico Lourenço para a Cotovia. Como esta arqueologia das palavas, numa história com três mil anos, em que Nestor fala a Diomedes:

"Pois agora para todos se coloca no fio da navalha".

Ou então, pouco mais adiante:

"Hão-de ficar onde estão [os troianos], afastados das naus, ou hão-de regressar à cidade, uma vez que já deixaram os Aqueus na mó de baixo."

Na "mó de baixo" e no "fio da navalha". Há três milénios que usamos estas expressões e eu não sabia. Na Introdução, o tradutor explica que este é o mais antigo registo da frase "no fio da navalha". E há outras coisas tão parecidas às dos nossos tempos...

Relativismo

Sou um puericultor. Mudo fraldas com chichis e cocós, dou banhinhos relaxantes todas as noites, penso em estratégias de embalo, estudo a semiótica do choro, faço massagens na barriguinha para o piqueno aliviar as dores, acordo ao de leve de noite quando a Carla dá de mamar... Não, não vou escrever sobre as autárquicas. Tanto me faz. E dá-me ideia que a consistência do cocó de ontem seria um tema de conversa mais interessante.

06 outubro 2005


"Há, em Veneza, três lugares mágicos e secretos: um na rua do Amor dos Amigos; um segundo nas proximidades da ponte das maravilhas, e um terceiro na calle dei Marrani, perto de San Geremia, no velho ghetto. Quando os venezianos - por vezes malteses - se cansam das autoridades, dirigem-se a estes lugares e, abrindo as portas ao fundo desses pátios, partem para sempre para países fantásticos e outras histórias". - Fábula de Veneza, Hugo Pratt
Tiago e Joana: já têm aqui a cartografia dos portais fantásticos; se os atravessarem para o outro lado, podem prolongar por mais uma horas este dia especial.

04 outubro 2005



De Veneza regressa numa vinheta de 35 mm diante do leão antigo do Arsenal como Corto na Fábula.

02 outubro 2005

«Para Veneza!», exclamou, repetindo o pedido de Aschenbach e estendendo o braço para mergulhar a pena no líquido pastoso que mal cobria o fundo de um tinteiro inclinado na sua frente. «Uma primeira para Veneza! Aqui tem, cavalheiro!» Rabiscou uns gatafunhos largos, polvilhando-os com uma areia azulada contida numa caixa, que escorreu para uma taça de barro, dobrou o papel com os dedos amarelados e nodosos e escreveu do lado de fora. «Que escolha feliz para a sua viagem!», aventurou entretanto. «Ah! Veneza! Que cidade maravilhosa! É fonte de atracção irresistível para a pessoa instruída, tanto pela sua história como pelos seus encantos de hoje!» A fluência e a rapidez dos seus gestos e as frases vazias com que os acompanhava tinham algo de envolvente e distractivo, como se suspeitasse que o viajante pudesse ainda vacilar na sua decisão de partir para Veneza.

Thomas Mann, Morte em Veneza

(Até p'rá semana.)

01 outubro 2005

Washington «Post»


Está a passar no Quarteto o documentário Dentro de Garganta Funda. Apesar de gostar de conhecer a fundo os escândalos da política mundial, não vejo qual é o interesse de assistir a uma endoscopia ao Mark Felt.